domingo, 30 de novembro de 2008

O grande vidro e a pequena vida

Serena vivia solitária naquele local, em que o tempo parecia estar contido em uma imensa bola de cristal, como que prisioneira da própria vida, até a chegada de Prodigal... Quando o jovem ali chegou, levemente envelhecido, desde que se afastara do lago azul profundo, o sol intenso viajara com ele, por entre as árvores do bosque, até subir ao meio do céu... A visão do cavaleiro pelos aldeões, durante aquela jornada, criou o mito de sua imortalidade, já que cada escudeiro sempre assumia as vestes de seu senhor, quando de sua morte. Assim, a fama do Dragão Negro correu por toda região, junto com sua andança até chegar ao outro lado do bosque Sem Fim. Ali, sentira a sensação de que deveria ficar algum tempo mais, antes de seguir adiante. Precisava descansar, sentia muita fome e solidão.

Serena observava com receio aquele desconhecido. Tudo que a jovem aprendera na vida ─ e todos os segredos para sobreviver num mundo de estranhos ─, trazia consigo no Livro dos Desejos (ali estavam contidas também suas receitas mágicas). Tudo que sabia aprendera com a sua mãe, que passara o segredo recebido de sua avó, e assim por diante. Serena compilou no livro aquelas receitas de vida, fruto de um conhecimento milenar, restrito às mulheres do clã, pois cabia aos homens apenas guerrear e procriar. Estes eram céticos quanto aos encantos das mulheres e seus manjares. Satisfaziam-se apenas em suprir seus instintos, encher a barriga, e depois ruminar, virados pro lado... Não notavam que os pratos fortaleciam seus braços e pernas a cada véspera de batalha. Viviam como ursos, com muita força bruta e nada mais.

Naqueles tempos sombrios, as mulheres acompanhavam as fases da lua, e seus ciclos de 28 dias... Aos 16 anos de vida eram mães e aos 32, avós. E a cada mudança da Lua Prateada no céu cinzento, de minguante para crescente, de cheia para nova, algo acontecia no local onde elas estavam, tendo que partir ou se esconder até o efeito passar... Aquelas mulheres possuíam uma língua secreta, e o que falavam nenhum homem entendia. Tudo sempre subentendido, nas entrelinhas do tempo, nos olhares sem que a boca se movimentasse. Mas os “ursos”, “não queriam dar o braço a torcer”, nem confessar que não entendiam suas esposas, irmãs, filhas... Os guerreiros sabiam apenas manejar com destreza escudo e espada, mas o coração parecia de chumbo fundido. Exceto um deles, que não era daquele reino, e que fora o fiel escudeiro de um cavaleiro, herdando de seu Senhor e Mestre, além dos trajes, o próprio nome, já que tinha incrível semelhança com o nobre, que lhe criara como um pai. A convivência os deixara parecidos demais... O menino do lago não conhecia o verdadeiro pai e fora criado por duas mulheres, antes de seguir os passos de Lord Drago: Sua mãe Vida (que morrera de desgosto, sem contar o nome de seu progenitor) e sua tia Alma (que enlouquecera, também guardando pra si o perverso segredo).

Ao passar a usar roupas e nome do seu Senhor, depois de sua morte, o jovem escudeiro, sem querer, criou naquele reino a lenda do Cavaleiro Imortal, que jamais envelhecia, e que vivia de léguas em léguas a lutar por causas perdidas. Os soldados do reino, que o viram tombar na noite anterior, diante do castelo de Messiter, não encontraram seus restos mortais. A lenda assim foi tomando novo corpo...

Um dia, Prodigal sabia-o bem ─ travestido de Lord Drago e ainda sem escudeiro ─, teria que ir às redondezas do castelo, pois lá dizia o Livro do Destino, em seu poder, vivia a bela princesa Cristal, que possuía o Livro dos Sonhos. Lord Drago tinha deixado pistas de que cabia a Irmandade do Vento zelar pela preservação desse e doutros livros mágicos (Do Destino; Dos Dias...), contra a ânsia de poder da Ordem do Tempo e do Colecionador.

Quando o rapaz contornou o estranho rio que margeava o ainda mais estranho bosque, trazido pelo aroma desconhecido e sedutor, mal sabia que fora conduzido ali pelo perfume do tortei encantado. Estava ele diante da pequena casa com a janela aberta e um prato a esfriar, quando uma silhueta em seu interior parecia encará-lo com temor. Um estrondo vindo do nada, amedrontou a ambos. Logo, Prodigal percebera que era nada mais nada menos que seu estômago roncando de fome...

Serena segurava nas mãos um cajado. O cavaleiro pensou no início ser alucinação, tal a beleza da mulher, que aparentava se aproximar dos dezesseis anos, e que era tida como bruxa para uns e a fada para outros. Santo de casa realmente não fazia milagres naquele local. Mas para ele, um Cavaleiro do Vento, aquela imagem saída das sombras era mais do que uma Aparição. De imediato sentiu o peito ser transpassado como se por uma espada mágica. A mulher, que pressentia às coisas e tinha curiosas visões, sonhara na noite anterior com um escudo reluzente em forma de lua prateada, com a misteriosa inscrição Nessun Dorma...

O tempo que se arrastará até aquele local, de repente voou que nem um falcão negro atrás de uma pomba branca no céu azul profundo. Um vácuo cobriu a região e o silêncio pousou entre os dois, além de densas nuvens. Serena vendo o olhar aflito do cavaleiro, largou o cajado, oferecendo um pedaço de seu manjar ao faminto, que por conta dessa gentileza também se desarmou. Antes que a noite de Lua Nova se aproximasse, tanto Serena como Prodigal seriam reféns do olhar um do outro. E não dormiriam com medo de ao acordar tudo não passasse de um sonho, como o tortei encantado...

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

O Grande Sonho

Cristal passara os dias em seu quarto, sua ama astuta e perspicaz lhe cuidara e fazia-lhe todas as vontades, em meio a um devaneio, Cristal acorda agitada e grita pavorosamente:

- Meus olhos?

A ama corre e a pergunta o que houvera, ela respondeu-lhe:

- Sonhei com um homem malvado, mas não via-lhe o rosto, apenas a barba, era comprida e alva, usava um manto e roubara meus olhos. O mais fantástico é que eu enxergara tudo no sonho, e sabia tudo o que vira. Ele me disse que jamais devolvera-me o olhar, por culpa de meu pai que havia lhe roubado algo que não quis me dizer. Será? Ama! Será que isto foi apenas um sonho?

A ama não lhe respondeu nada, apenas grunhiu um “uhum” como sinal de concordância com o que a princesa havia pensado.

Cristal acalmou-se, mas pensara sem parar em seu sonho, seria apenas um sonho, ou seria um aviso, uma resposta, um enigma, um sinal inconsciente que haviam lhe enviado, estava apreensiva, e disposta a saber o que realmente havia lhe acontecido para não poder ver o mundo, para viver apenas de sensações, que mal haviam lhe cometido. Embora soubesse que já nascera assim, pelo menos foi o que seu pai lhe dissera quando despontou-lhe a curiosidade de sua deficiência, enfim, encontrava-se em desespero, e ao mesmo tempo esperançosa em um dia poder enxergar tudo que lhe cerca, tudo que sonhava e ter um príncipe que a mereça.

A dúvida ficara no ar e Cristal quando chegou a noite, ditou mais um poema a seu escriba:

O Grande Sonho

Sonho, sonho horrores,
Sonhos dolorosos, latentes e majestosos.
Sonhos de uma fada, com perfume de flor,
Sonho de uma luz, um brilho, o Sonho,
Imenso, grandioso e eloqüente.
Que se torna fascinante, em um grito,
De horror, desmerecido, a Culpa,
E raiva, vingança e tormento.
Quero ver, Ver a lua, Ver o sol,
Ver! Ver! Ver...
Saber...
Se é Sonho, se é Vida!

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

O tortei encantado

Assam a massa... Assim era o último verso em forma de palíndromo de um novo e enigmático poema que trouxe o novo cavaleiro do dragão negro até o outro lado do bosque Sem Fim, contornando às densas árvores, algumas com estranhas formas de troncos que pareciam gente...

Próximo ao Reino de estranhos, havia uma aldeia de um povo novo, onde morava solitária uma mulher sem igual, chamada Serena, filha de Ísis, e tida pelos vizinhos como curandeira, e pelos sacerdotes mais conservadores, como bruxa, tal o encantamento que sua culinária, seus chás e seus olhos radiantes proporcionavam a quem merecesse tal distinção.

Remanescente da misteriosa seita da Lua Prateada, que quatro vezes por mês se reuniam, vindo de todas as partes daquele reino e d’outros mais distantes, com seus capotes pretos, cobrindo corpos e rostos, e cujas integrantes possuíam mil encantos e receitas mágicas, passadas de mãe para filha, de geração em geração. Para aquela seita, o universo fora gerado por uma Deusa, que também nasceu de um útero imenso e universal. Os últimos relatos que Serena tinha, da memória familiar, remontavam à construção das primeiras pirâmides no Deserto dos Sonhos, contudo sabia que o início de tudo que conhecia vagava trêmulo entre a mitologia e a história mitificada. Todo o conhecimento que tinha veio de relatos orais, de tempos em tempos, quando a filha menor, precisava atravessar o Mar Vermelho interior...

Daquele dia em diante, sob o brilho da Lua Prateada, imenso móbile bailando no céu, a mãe passava à filha, já mulher, suas receitas guardadas a sete chaves, do segredo do bem viver, quando começava a ensinar os primeiros ingredientes secretos e o seu modo de preparo, ainda na tenra idade. Um deles era curioso ritual do Tortei Encantado, que necessitava de uma moranga nova, espécie de abóbora, que deveria ser colhida sempre na noite de Lua Crescente, para que a receita e o encantamento prosperassem ao redor de seu mundo exterior... Moranga que necessitava ser cozida e esmagada, passada em farinha de rosca até dar a tal “liga”. Em seguida, colocado o açúcar, precisava de uma pitada de sal e noz moscada ao gosto. Para a feitura da massa era preciso ovos e farinha. Depois, uma galinha, ainda viva... E, a seguir, misturando a carne branca desfiada com tomate, cebola, pimentão e outras coisas mais, dependendo da ocasião. Por fim, levando tudo ao fogo brando, mexendo e remexendo até ficar bom...

O tempo e o espaço tornaram mãe e filha distantes, mas graças a essas receitas, as duas permaneciam com a mesma “liga”, o que tornava a farinha em massa saborosa. Ao fazer a receita familiar, conseguiam se comunicar e pressentir o perigo que uma passava a outra, e pela receita, equilibravam o ambiente familiar e a saudade, palavra que não existia em seu vocabulário, até as duas se separarem. Viviam perseguidas, de aldeia em aldeia, pois a população não entendia seus poderes extraídos da lua e seu jeito de ser tão natural. Imaginem só! Em tempos remotos, em que todos seguiam a risca seus papéis, portando-se como personagens de um jogo, mulher ter opinião e escolher o que deveria fazer! Uma blasfêmia para os sacerdotes, uma afronta aos reis, um escândalo até mesmo para as nobres e submissas mulheres da Corte, sombras pálidas de seus Senhores. Estas eram quase escravas, embora não usassem ferros, nem fossem chicoteadas, mas viviam presas a própria masmorra interior, como se numa bola de cristal imensa, feito as galinhas, que retidas por um simples círculo de giz, jamais atravessavam sua invisível prisão...

Serena era diferente de todas, e isso chocava a homens e mulheres da região, que não entendiam seu jeito de ser livre como a Lua Cheia no céu, por isso vivia reclusa, como medo de perseguição.

Dizia antiga lenda ─ passada de pai para filho ─, que aquele que provasse do tortei encantado, em noite de Lua Nova, tornava-se um novo homem, e que se tivesse o azar de ser em Lua Minguante, minguariam todos os seus sonhos e bens. Porém, quem experimentava do tortei encantado, poderia até esquecer quem era, mas jamais esqueceria aquele prato, seu tempero e sua criadora. Notícias de outros reinos davam conta de que alguns ficavam destemperados antes da hora, o que só lhes dava dissabor. Mas aos que tinham a paciência de esperar que o tortei ficasse no ponto, e que jamais contavam a alguém o segredo da receita mágica, a esse nobre cavaleiro poderia acontecer uma Revelação... Naquele tempo calamitoso, as mulheres criavam receitas de bem viver, e os homens histórias de faz-de-conta entre seus pares...

Quando Prodigal, montado em seu cavalo baio, chegou ao outro lado do bosque, encontrou uma pequena casa. Serena tinha terminado de assar a massa encantada, colocando-a na janela de sua casa rústica para esfriar. O sol se encontrava no meio do céu e os cabelos ruivos, cor de fogo, daquela mulher despertaram no cavaleiro chama crescente, sem igual...

quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Valeriano busca respostas

Para acabar de uma vez por todas com tanto mistério. Valeriano, aproveitando a mudança da lua, vestiu a longa capa negra e saiu decidido a colocar tudo em pratos limpos. Era uma noite fria e clara, o rapaz percorreu todo o caminho com passos longos e apressados. Após cansativa caminhada, finalmente chegou ao seu destino: a floresta.

Embora a lua iluminasse todo o vilarejo, na floresta tudo era muito escuro devido à grande quantidade de árvores que ali existia. Com medo e curiosidade seguiu. Continuando a caminhada entre a escuridão. Não sabia para onde ir, tudo era muito igual. Foi quando viu ao longe uma imensa claridade e seguiu até ela. Ao chegar mais perto verificou se tratar de uma imensa fogueira com algumas pessoas ao redor, elas estavam com seus braços erguidos, gritando frases em um dialeto não compreendido pelo jovem, pareciam exaltar algum deus ou coisa do tipo. Para sua surpresa, todos vestiam uma capa negra igual a sua. De repente silencio e alguém tomou a palavra:

- Amigos, há algum tempo estamos caminhando com nossas próprias pernas, visto que nosso mestre já cumpriu seu tempo nesta vida. Esta noite é especial, um dos nossos que ainda não se recorda de nosso grupo está perto. Chegou para tomar o papel de líder e assim como seu pai, honrar a natureza e utilizar seus poderes e encantos para acabar com o foco de distribuição do mal, desvendando a grande verdade e nos devolvendo nosso objeto mais estimado.

Valeriano escutava a tudo com atenção, pensava em quanto mistério envolvia aquele grupo. Havia algo de diferente no ar. Por mais loucura que tudo aquilo podia parecer, ele sentia uma estranha sensação de não ver tudo aquilo como novidade, parecia já ter vivido algo do tipo. Respirou fundo e foi em direção ao grupo. Foi quando aquele que falava ao grupo calou-se e ordenou que todos os demais reverenciassem Valeriano. Instantaneamente, todos retiraram os capuzes e ajoelharam-se perante Valeriano. Quando percebeu, ali estava o rapaz de uma vida triste e solitária, sob uma lua cheia, com sete pessoas ajoelhadas aos seus pés e o calor da fogueira a esquentar a face.

- Queiram me desculpar, mas o que está acontecendo? – Perguntou Valeriano. Minha vida se transformou em outra coisa de pouco tempo para cá. Agora um bando de loucos que usam uma capa igual a do meu pai dizendo que estou aqui para substituir o líder. Eu sou apenas mais um sobre essa terra, não faço diferença nenhuma. Preciso apenas cuidar direito da minha horta para não morrer de fome e assim são todos os meus dias. Nunca fiz o mal, sempre procurei agir corretamente como me ensinou meu finado pai. Por que isso? Qual o mistério por trás de tudo? Por favor, me respondam! Eu não agüento mais!

Após alguns minutos de silencio, a pessoa que estava discursando pouco tempo atrás e se parou na frente a Valeriano. Era uma mulher alta, cabelos negros e olhando dentro dos olhos do rapaz disse:

- É chegada a hora, Valeriano. Seu retorno ao nosso grupo é muito bem vindo. Feche os olhos e tente se lembrar dos fatos. Irei lhe contar tudo.
O rapaz, ainda que desconfiado, seguiu as orientações e fechou seus olhos. Foi quando a mulher começou a falar:

- Há três vidas passadas nosso grupo...

terça-feira, 21 de outubro de 2008

O palíndromo e a dupla face


O menino do lago levantou-se do chão com a garrafa contendo o Livro do Destino , fazendo um barulho metálico em seu interior. Ali dentro, estavam três dados de metal (um de ouro, outro de prata e um de bronze), para serem usados junto ao livro. Com aquele pequeno tesouro em mãos, dirigiu-se ao local em que Insônia tinha guardado as coisas de Lord Drago. Entre sete árvores, a sete palmos de terra adentro estava o corpo do cavaleiro do dragão negro. A sete passadas largas ao Norte da sepultura estavam também enterradas a sete palmos de chão toda a vestimenta e armas do guerreiro morto.

Pelo caminho, Prodigal notara que quanto mais se afastava do lago sua pele parecia enrugar ao calor do Sol, e sua mente a esquecer das formas da bela mulher que mergulhara com ele no fundo do lago Azul Profundo. Se de dia a esquecia, a noite voltaria a lembrá-la, encontrá-la? — perguntou a si mesmo.

Depois de lavar a malha, o colete, o elmo, o escudo, a lança e a espada na beira do rio, viu o homem no reflexo da água o rosto de Drago refletido, ao invés do seu. Levou um susto! Se estava ainda sonolento, de todo acordou. Jogou mais água no rosto, e o semblante de menino do lago retornou a sua dupla face. Com a garrafa na mão, retirou o Livro do Destino e os três dados, para guardá-los, como seu Mestre o havia ensinado, num local que somente ele ou seu fiel escudeiro soubesse. Sem ainda ter um ajudante, preferiu correr o risco e ficar com o papiro dentro de sua roupa e os dados grudados no espaço que antes fora da pedra vermelha ─ conhecida como o Coração do Dragão ─, tendo um encaixe perfeito; vestindo em seguida a armadura completa para seguir viagem. Seu cavalo baio estava ali próximo, em uma árvore amarrado. O cavalo negro de seu amo tinha igualmente perecido com seu dono.

Quando o escudeiro, agora travestido de cavaleiro, empunhou firme no braço esquerdo o escudo com a inscrição Nessun Dorma (que ninguém durma) e na mão direita a espada reluzente de Lord Drago, pela primeira vez em eu poder, percebeu pela primeira vez nela curiosa inscrição, em letras diminutas. Palavras que estavam inscritas em um antigo relógio de sol, quando Drago iniciara o menino do lago, filho de Alma (a que se matara) e sobrinho de Vida (a que enlouquecera), em seus estudos de latim e arte da guerra:

- Transit umbra, sed lux permanet. (A sombra passa, mas a luz é duradoura).

Naquele instante, palavras, como flechas, saíram de sua boca, sem ele saber como:

- O meu reino sou eu mesmo e tem em mim a pedra fundamental.

O novo cavaleiro de si mesmo desconhecia muita coisa que o rodeava. Dentre elas que Insônia também conhecia o latim, pois fora a serviçal de um sacerdote atormentado por seus demônios interiores, que a perseguia sem sucesso às noites (quando ela por encanto desaparecia entre os corredores escuros do mosteiro), fazendo-o supliciar-se ao dia, até que a mulher do lago fugiu daquele local, para nunca mais voltar. O padre, todo de branco e repleto de ouro, tinha a alma em total escuridão. Mas foi um outro padre, todo de preto e em completa penúria, que a protegeu do outro, até indicar-lhe o bosque como o reduto onde as mulheres perseguidas pelo falso religioso, pudessem viver em paz. As que resistiam a ele, condenadas por bruxaria, e confessando a heresia, sob tortura, eram levadas à fogueira. Insônia, se não partisse dali, teria o mesmo destino cruel das outras. Contudo, mesmo longe, ela sempre estava por perto de quem precisava de ajuda, conhecendo todos os atalhos que levavam do mosteiro ao Bosque Sem Fim. Um lugar encantado que tinha tal nome, pois aquele que não soubesse andar pelas trilhas ─ como que preso num labirinto de árvores ─, jamais retornava de lá... Porém, existia uma misteriosa profecia que dizia que o bosque poderia perecer o dia em que os Gigantes de Um Olho Só viessem àquela terra visitar.

Prodigal, nada disso sabia, e ao consultar Livro do Destino, jogando os três dados de metal, somadas luas e estrelas neles, dava o número dezesseis, e no verso dezesseis do Livro do Destino haviam igualmente dezesseis versos enigmáticos em forma de palíndromos:

A porta rangia à ignara tropa.
A base do teto desaba.
Lá vou eu em meu eu oval.
A semana toda lemos: só melado tá na mesa.
Assim, a sopa só mereceremos após a missa.
E até o Papa poeta é.
E assim a missa é...
A torre da derrota.
Livre do poder vil.
O mito é ótimo.
Acata o danado... e o danado ataca!
O terrível é ele vir reto.
Reter e rever para prever e reter.
Soa como caos.
Sós: somos sós.
Assam a massa.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

A bola de Cristal foi passear

Era uma manhã linda, novamente o sol tomava conta do reino de estranhos e lá no Castelo continuava o alvoroço pelo sumiço da bola de Cristal do Mago Sidelar, embora estivesse mais que preocupado, o Mago preparava uma magia para desvendar o paradeiro de sua bola de Cristal. Com vários ingredientes nem um pouco comuns para a realização de sua mágica ainda faltava encontrar uma porção de gosma quântica, o que era muito raro nas voltas do reino.

Enquanto isso o pequeno ladrão de frutas preparava-se para mais uma manhã de pesca com seu pai, pois haviam de juntar boas moedas para que o casamento de sua irmã fosse realizado com a benção da Majestade, o preço era muito alto, e era o sonho de todas as moças do reino casar em cerimônia dentro do Castelo de Messiter. Neste dia, o menino resolveu levar a moça de branco com ele, pois se sentia em falta com ela, e queria agradar-lhe com um passeio de barco, colocou-a dentro de seu saco de estopa e a levou todo o tempo presa as suas costas, seu pai pouco se importou com o que o menino carregava, apenas pensava nos peixes que o mar lhe daria naquela manhã. Em certo momento em que seu pai estava de costas no pequeno barco, o menino tirou a bola de Cristal de dentro do saco e mostrou à moça a beleza de lugar que ali se encontrava, ela ficou muito feliz e emocionada com a atitude do garoto que lhe agradara. Ao voltarem repletos de peixes, o dia foi mais um dia de festa e reunião de famílias em volta da mesa.

A noite caíra e o menino se trancara no quarto, por um momento pensou que a moça de branco estava dormindo, mas se enganou, pois ela abrira os olhos e lhe abrira um sorriso lindo que irradiava felicidade e ansiedade, perguntou-lhe:

- Quando me levaras para passear pelo bosque, pelo reino e de novo no mar?

Ele respondeu:

- Minha amiga, eu não sei... não sei se devo, mas logo que achar que posso e me sentir seguro de andar com você pelo reino eu lhe levarei para passear!

Ela não ficou muito contente, mas sentiu a franqueza do garoto em suas palavras, o que a deixou com um sentimento de esperança e voltou-lhe a perspectiva de sair de dentro da bola de Cristal. Ela o desejou boa noite e o garoto ficou deitado pensando em como seria o casamento de sua irmã.

domingo, 5 de outubro de 2008

O lago Azul Profundo


Após enterrar o corpo de Drago, ao lado da mais frondosa árvore do bosque, e com a sua malha lavada e costurada por Insônia, cabia a Prodigal seguir a sina do cavaleiro do dragão negro, primeiramente achando o Livro do Destino (pelo seu senhor sempre escondido antes de cada batalha) e depois escolhendo um fiel escudeiro para que a sua jornada continuasse. Mas quem escolher, se ele estava sozinho naquele mundo de estranhos?

Sem dizer uma só palavra, Insônia - que não lia pensamentos, mas entendia os olhares das pessoas e seus sentimentos -, disse ao jovem:

- Tu primum exhibe te bonum, et sic quaere alterum similem tui. [Publílio Siro] (Primeiro mostra que és bom, e assim procura outro semelhante a ti). Tudo tem o seu devido tempo.

- Você poderia acompanhar-me nessa viagem, ser minha escudeira? – retrucou o jovem, em forma de pergunta a mulher, que fazendo uma pausa, disse:

- Tui cum sitiant, ne agros alienos riga.[Publílio Siro] (Enquanto os teus campos têm sede, não vás regar os alheios). Primeiro, precisas decifrar teu enigma interior, para depois partir em uma jornada. Precisas descobrir o livro da tua existência, antes de querer mudar o mundo... O teu mundo começa e termina em ti mesmo...

Prodigal então, relendo diversas vezes o enigmático poema deixado por Drago, percebeu que o cavaleiro deveria ter escondido o livro num local ermo, de difícil acesso, entre o sono e o sonho profundo, como falavam os versos... Se ao céu ele não poderia alcançar, ao sono profundo de um lago, quem sabe ele pudesse chegar. Se Drago se arrastara, ferido de morte, até a beira daquele lago Azul Profundo, provavelmente em seu leito fundo ele tenha sepultado o Livro do Destino, para que seu fiel escudeiro, quando preciso fosse, o achasse...

Depois de contar a Insônia seu intento, de ir ao fundo do lago, Prodigal escutou daquela espécie de deusa das águas, em forma de mulher de areia, uma curiosa sentença:

- Tracta ante factum, quia post factum sera retractatio est. [S.Bernardo, De Consideratione 4.11.1] (Examina antes de fazer, porque depois de feito é tardio o arrependimento). Se é isso que desejas, contigo estarei.

- Não há do que se arrepender, mulher. O único arrependimento é o de não viver a vida ao seu momento. Ajude-me a ir até o fundo do lago, do qual, parece-me que você sabe todos os segredos e encantos para guiar-me aos meus medos mais secretos... E eu te recompensarei com minha eterna lealdade.

- Tranquillas etiam naufragus horret aquas. [Ovídio, Ex Ponto 2.7.8] (O náufrago tem medo até das águas calmas). Mas enfrentar o medo é a maior prova de coragem!

- Entendo o que dizes, Insônia. Minha vida é um eterno naufrágio. Estou sempre à deriva. Não consigo ler a rosa-dos-ventos, e isso que sou agora um cavaleiro da Ordem do Vento. Mas se você vier comigo não estarei mais só.

- Tranquillo quilibet gubernator est. [Sêneca, Epistulae Morales 85.34] (Com mar calmo qualquer um é piloto). Aproveite, então, o lago sem ondas, pois quando for preciso adentrares ao mar revolto, precisarás estar pronto para enfrentar a tudo e a todos: dos golfinhos aos tubarões, e saber distinguir de longe, uns dos outros.

- Certamente. A vida é para os que sabem contornar o Cabo das Tormentas e descobrir um Novo Mundo, que dizem existir n’algum lugar distante ou em si mesmo. Então, auxilie-me a chegar ao fundo do lago e de lá trazer comigo são e salvo o Livro do Destino para que eu possa seguir em minha missão.

- Traditio nihil amplius transferre debet vel potest, ad eum qui accipit, quam est apud eum qui tradit. [Digesta 41.1.20] (A transmissão não deve nem pode transferir ao que recebe mais do que está com o que transmite). Mas fiques tranqüilo, acompanhar-te-ei os passos e as braçadas sempre, da mesma forma que a lua no céu segue aos homens pela noite funda...

E dito isso, a mão direita da mulher pegou a mão esquerda do impetuoso jovem, conduzindo-o apressadamente à beira do lago, antes do raiar do sol. O eclipse da lua estava por terminar quando eles mergulharam profundamente nas águas calmas, afundando num estado de quase sonho e sono fecundo, profundo, indo até o mais fundo de seus redemoinhos interiores. A água era doce, clara e morna como um sonho. Lá embaixo a paz reinava, bem diverso de à tona. Os dois sempre de mãos dadas foram se aprofundando no lago calmamente. Havia uma harmonia incrível entre ambos, a água fluía por seus poros, e o tempo não era percebido ao seu redor. Com a respiração presa, e o coração disparado, foram indo e indo mais fundo.

Mais adiante, quando Prodigal viu uma reluzente garrafa submersa, presa entre corais, pensou: eis o sinal! Insônia fez-lhe um gesto com a mão: vai! E o jovem abriu bem os braços e mergulhou mais fundo, ajoelhando-se em frente a misteriosa garrafa prateada. O que teria em seu interior? Seria o Livro do Destino, em forma de papiro enrolado? Teria algo mais. Estaria vazia ou seu conteúdo deteriorado? Mil e uma possibilidades lhe passaram pela mente, já não conseguindo mais prender a respiração... Fez muita força até que a garrafa desprendeu-se dos estranhos corais. Quase perdendo os sentidos, virou-se procurando Insônia para pedir-lhe ajuda, mas não a encontrou mais. A sua sereia havia desaparecido no lago azul profundo ou teria emergido na praia? Tomado de pânico, com medo de se afogar, voltou à tona, e lá não encontrou mais sequer as pegadas na areia daquela misteriosa mulher. Desaparecera no ar ou na água? O vento teria apagado sua visita? Lembrou-se apenas de suas últimas palavras, quando Insônia deixou subentendido que estaria ao seu lado ao anoitecer... Sem fôlego, com a garrafa nas mãos, caiu exausto à beira do lago, em um sono profundo, em busca de respostas para as perguntas cada vez mais complexas...

Em sonho, reencontrou Insônia, sempre bela, com vestes reluzentes, que lhe dissera pausadamente:

- Tu si hic sis, aliter sentias. [Terêncio, Andria 310] (Se estivesses no meu lugar, pensarias diferente).

Naquele instante, Prodigal acordou sobressaltado, sem saber quanto tempo passara ─ afinal, naquele Reino de estranhos o tempo parecia como que aprisionado em uma imensa bola de cristal...

Observação: Imagem acima, extraída da internet, do endereço abaixo
http://www.nooneelse.blogger.com.br/arvores%20azuis.jpg

sábado, 27 de setembro de 2008

O sétimo tempo anunciado

O bispo branco correu feito o vento em direção aos campos de trigo até perder o fôlego. Deixou-se tombar de todo comprimento e peso, e no chão permaneceu por horas, o rosto enfiado no pasto, como uma minhoca que procura abrigo. Na cabeça, imagens formavam-se e atropelavam-se, misturando presente e passado e possíveis pedaços de futuro, num ritmo tão desconcertante que definitivamente o desconcertou.

Perdeu a noção do tempo, a consciência do corpo, e o fio da realidade. Invadiu o absurdo com força, porque tinha medo do porvir e porque rejeitava essa habilidade de antever o logo. Desde a infância sentia assim o desajuste: era estranho além da média dos estranhos familiares. Aos sete anos pressentiu a chegada de uma nuvem de gafanhotos que devastou as lavouras da região. Aos 14, intuiu a investida de uma tribo Atrixar que matou um terço da população do vilarejo, sem poupar sequer as crianças. Mais tarde, aos 21, percebeu a estranha relação de dores agudas na cabeça, bem no centro da testa, com a proximidade da epidemia Marja, que dizimou famílias inteiras alastrada pela água que abastecia o vilarejo.

Curiosamente, assim foi, de sete em sete, encerrando e recomeçando ciclos de visões aterradoras. Escolheu a vida religiosa para se distanciar dos olhos dos outros, pois temia o poder da incompreensão e precisava encontrar a fé, ou, pelo menos, algumas respostas. Os fragmentos do tempo e de histórias desconexas jamais deixaram de perseguí-lo, mesmo perto do Deus de então, e ao fim de sete tempos certamente nova destruição viria.

Naquele mês findava o sexto ciclo. O bispo, branco, correu feito o vento em direção aos campos de trigo e, na medida em que avançava entre o verde amarelecido do campo, enveredava pelo labirinto da própria mente, forjando uma clausura particular, que o abrigaria do destino incurável, esse de ver o tempo, assim, sem freios. Sentiu a pele do rosto roçar a grama e sorriu nervosamente, pediu ao seu Deus que desse fim àquela vida torta e infeliz. E mais uma vez viu: viu o crucifixo de prata que trazia preso ao pescoço pendendo até o nível do umbigo, por dentro do hábito, ganhar um brilho incomum e erguer-se acima da sua cabeça. Viu-o reluzir e cravar fundo na ausência de cabelos, "para isso servia a calvície", pensou, "veio se armando aos poucos para receber a ponta fria e prateada que me mostraria a redenção", e sorriu.

O verde amarelecido do campo de trigo ao redor do bispo encheu-se de pingos vermelhos e guardou o santo homem durante os meses que se seguiram. Foram meses de silêncio e de esquecimento, tempo em que os pássaros de asas negras estiveram encarregados de desconstituir o corpo e as vestes. Sobrou o cordão de prata com o crucifixo da ordem entre ossos e carne decomposta. O sétimo tempo já havia começado.

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Semper et ubique

Sempre e em toda parte, assim Lord Drago, integrante da Irmandade do Vento, referia-se ao Colecionador, o poderoso guardião da Ordem do Tempo, que nem os seus iniciados nem os mais infiltrados naquela sociedade secreta conheciam a verdadeira identidade... A única coisa que o cavaleiro do dragão negro sabia e tinha repassado a Prodigal era o fato de que, em caso de morte do cavaleiro, caberia ao fiel escudeiro assumir sua armadura, escudo e espada, carregando consigo o Livro do Destino, para tentar protegê-lo, ainda que com a própria vida, da cobiça do Colecionador, que desejava possuir todos os livros do mundo e dominar com isso todo o conhecimento humano em sua Biblioteca Sepulcral...

Lord Drago sabia que naquele Reino de estranhos existiam outros dois livros mágicos (dos Sonhos e dos Dias), que juntamente com o seu, o do Destino, continham em si a chave para enfrentar o temível Colecionador. Temendo por sua ruína, prevista nos dados e no livro, Drago guardara aquele oráculo num local enigmático que somente seu fiel escudeiro, se viesse a lembrar de seus ensinamentos, poderia encontrar...

Na beira do lago Azul Profundo, Prodigal pediu a Insônia que o ajudasse a retirar a pesada armadura de seu amo e Senhor. A mulher, sem dizer uma só palavra, acatou seu pedido. Os dois, com muita dificuldade, abriram uma a uma as fivelas daquela quase inexpugnável malha. A pedra preciosa, chamada o coração do dragão, ainda vertia sangue. Um pequeno mar vermelho se formou ao redor do imenso corpo sem vida. Após alguns minutos, o cadáver de Drago estava despido. Insônia aproveitou a beira do lago para lavar sua ferida.

Enquanto Prodigal desafivelava a malha nem percebera que a bela mulher tinha adentrado em um pequeno bosque ali próximo e de lá trazido ervas medicinais para fazer ungüento e cicatrizar a profunda ferida.

- Para que tanto cuidado com um corpo sem vida?, perguntou o jovem à moça dedicada.

- Semper et ubique unum ius (Sempre e em toda parte um único direito).

Envergonhado, conhecendo bem aquela língua ensinada pelo seu mestre, o escudeiro percebeu que teria muito que aprender com a vida e também com aquela mulher se quisesse se tornar um honrado cavaleiro. Tentando se redimir, trouxe a catapulta que arremessava os dois escudos de fogo, para poder carregar para dentro do bosque o corpo de seu amo e Senhor. Precisou de mais duas viradas de areia da ampulheta para que ele e a mulher cavassem uma cova funda, ao lado de uma imensa árvore, para em seu interior depositar o corpo de Drago.

Insônia trazia na cintura uma pequena bolsa enrolada, de onde tirou agulha e linha para costurar a malha do cavaleiro do dragão negro. Mexendo em seu interior, encontrou um pedaço de pergaminho, todo amassado, ensangüentado... Quando Prodigal se aproximou, a mulher alcançou-lhe o pedaço de papel, que continha um misterioso poema escrito, ao que tudo indicava, com o próprio sangue de Drago. Uma confissão? Um segredo? Que nada, quem sabe alguma mensagem cifrada indicando onde se encontrava O Livro do Destino, pensou o menino do lago tentando decifrar uma mensagem dentro de outra mais imbricada.

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D4-P4LM4-D4-M40-D4-MULH3R-4M4D4...
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3-0-T0RM3NT050-V1V3R-53M-T3-M1R4R...

domingo, 21 de setembro de 2008

Cristal e seu desejo secreto

Ao amanhecer no reino, a princesa Cristal acordara aflita e sentira uma vontade que lhe afligia há anos, ela necessitava do mar, o mar que ouvira falarem, o seu maior anseio. O reino de estranhos era banhado pelo mar em todos os lados, e a beleza que o caracterizava era singular pelas vistas perfeitas e fontes de inspiração por todos os cantos. Quando sua ama acordou pôs-se a contar-lhe que naquela noite havia sonhado com mar, que almejava senti-lo, tocá-lo e necessitava de forma absurda um contato com o maior ser que já ouvira falar... sua ama não soube como fazer, e o que fazer, restou-lhe a vontade de ajudá-la, mas mesmo assim a pobre ama não hesitou em ressaltar:

- Minha menina de ouro posso tentar, de alguma forma, mesmo que saias daqui as escondidas, mas terei de ter contigo mais tarde, pois tenho medo de confusões e o reino não anda muito calmo ultimamente. Veremos minha jovem! Veremos!

Cristal apenas sorriu, nada mais, no fundo sabia que sua ama realizaria seu desejo, mesmo que fosse as escondidas. Alguns momentos se passaram e ela já estava aflita, não sabia onde teria ido sua ama, nem a quem ela poderia contar para realizar o seu desejo, mas sentia uma forte sensação de esperança que brotava-lhe gotas de cristal nos olhos, Cristal estava emocionada com a possibilidade de sair um pouco do Castelo de Messiter e conhecer aquilo que tanto falavam e ostentavam como a maior fonte de vida do Universo... Certa vez ouvira uma história de um pescador e poeta, e que no mar perdeu a sua amada, mas que havia salvado seus escritos, ela achava linda a história, embora ao fundo fosse um pouco absurda, pois se tanto amava a mulher, o pescador de certo a salvaria e não um livro com alguns escritos...

- Minha menina!
Exclamou a ama.

- Mais tarde, mais tarde terás teu sonho realizado, vamos ao mar, mas não lhe contarei o ajudante que arrumei, pois sei que se algo acontecer ele poderá pagar muito caro, por isso ele será apenas uma sombra amiga que nos levará ao tão desejado mar de minha menina de ouro.

A princesa concordara com aquele pedido de sua ama, ela sabia que poderia confiar em seus contatos, e qualquer ajuda naquele momento seria bem vinda, pois já sentira o frio na barriga desde já.

A carruagem estava ao fundo do Castelo de Messiter, aquele horário da manhã poucos passavam por aquele local, a ama levava Cristal com cuidado e a instalava de forma confortável ao banco rodeado de véus brancos por todos os lados, assim seria impossível reconhecê-la ao sair do reino. O cocheiro avançava de pressa por entre o bosque e logo mais chegaria às dunas de areia, Cristal murmurava para sua ama o cheiro que sentira durante o caminho, o mato, as flores, o cantarolar dos quero-queros e demais sensações que só ela havia o dom de sentir, de repente deparou-se ao cheiro do mar, não lhe agradou de todo em sua primeira impressão, mas logo sentiu-se como uma descobridora dos mares, dos 7 mares. A carruagem havia parado, seu guia secreto não havia falado nada até chegar ao local mais escondido daquela imensidão litorânea:

- Chegamos minha majestade! Creio que seja de seu agrado... e estamos perto de pedras, que podes subir e sentir mais de perto a brisa do Mar, ou ainda colocar seus pés na água, apenas sentando-se a uma linda pedra ao sol!

A princesa estava sem palavras, não havia vocabulário para a descrição de tantas sensações, realizara seu desejo, sentia o cheiro do mar, tocava na água com seus pés, e ainda ganhara conchas de seu cocheiro secreto. Adorava aqueles momentos, não queria que acabasse nunca tal momento, a areia fez lembrar algo familiar que não conseguiu decifrar, a suavidade de seu toque, a água batendo em sua canela, todas sensações que mais tarde descrevera para seu escriba, já em seu aposento majestoso...

O Mar

Hoje quis sentir o mar,
Tocá-lo, pegá-lo, senti-lo,
Foi incrível! Absolutamente!
Enfim, seu cheiro em meu nariz eu pude sentir,
Seu gosto em meu hálito, e como fez palpitar meu coração,
A suavidade de sua agressividade batendo aos meus pés,
Espantei-me ao sentir o prazer das águas...
Seu perfume infinito, e sua grandeza profunda,
Suas areias, e suas conchas, sua maior vida!
Mar, imenso Mar!
Que um dia hei de te olhar!

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Mais uma carta misteriosa

Já havia se passado alguns dias desde a grande tragédia que ocorreu com Valeriano. Ele tentava retomar sua rotina normal, em sua simples e melancólica vida.
Os sonhos, os versos, os desenhos, tudo ainda estava muito vivo em sua mente. De repente escutou batidas em sua porta. Ao abrir não encontrou ninguém, apenas um pedaço de papel. Recolheu o mesmo do chão e notou que se tratava de uma carta sem assinatura, porém reconheceu o mesmo desenho que havia no bilhete encontrado dentro da capa.

Sou amiga, mas ainda não irei me revelar.
Você tem uma missão muito importante e precisa de esclarecimentos.
O trabalho que seu pai começou você terminará.
Muitas mudanças irão ocorrer neste reino e você será responsável por muitas delas. Pode se sentir sozinho, mas esteja certo que muitos dependem de você.
Algumas pessoas irão surgir em sua vida para ajudá-lo ou destruí-lo.
Vá ao bosque na próxima lua vestindo sua capa negra.
Lembre-se: nas dificuldades escondem-se as maiores alegrias.

Mais essa agora – pensou – por que tanto mistério?
Papai pelo visto foi alguém importante mesmo. Não foi a toa que o Rei mandou assassiná-lo. Farei o que for preciso para continuar o que meu pai começou, seja lá o que isso queira dizer...

domingo, 14 de setembro de 2008

O duplo eu e a longa jornada interior

Homo simplex in vitalitate, duplex in humanitate – eis o lema dos cavaleiros da Irmandade do Vento, lembrado por Prodigal ─ o menino do lago e o fiel escudeiro ─, diante do corpo sem vida de Lord Drago, seu amo e Senhor.

Nunca tivera acesso a todos os segredos de Drago, mas precisaria descobrir o paradeiro d’O Livro do Destino, para poder seguir a sina de seu portador: ser o cavaleiro do dragão negro e enfrentar os integrantes da Ordem do Tempo, que tudo sabem, tudo vêem, tudo controlam, catalogam, taxam... Enquanto a Irmandade do Vento se preocupa em descobrir o sentido da vida, contido na Árvore dos Dias, os membros da Ordem do Tempo, preocupam-se com o acúmulo de bens materiais; da reunião de tudo que é tipo de documento, texto, para confinar na sua própria Biblioteca Universal e sua visão cíclica, ciclópica... Ambos os grupos têm em um livro sua fonte de vida. Os primeiros, o do Destino; os outros, o Livro das Horas, pois tudo é calculado com precisão matemática...

Os cavaleiros do Vento são em sua maior parte desapegados dos bens, das terras, do materialismo vigente; porém, os do Tempo, tudo querem demarcar, definir, indexar, anexar, se apropriar... No Reino de estranhos ─ uma cidade-estado como outras tantas em sua época ─, oitenta por cento das terras pertencem a menos de vinte por cento das famílias. Os feudos são imensos e o Tempo naqueles redutos, incrível e paradoxalmente, parece estar encerrado numa pequena bola de cristal, como que em eterno vácuo, silencioso, sem nada ou quase mudar. Até mesmo quando dá a falsa impressão de mudar, mantém-se quase que intacto. Naquele local, dinastias se formam e se mantém no poder com o aval da Plebe Rude. Há rumores sobre a lenda de um jovem, chamado Robin Rude, em um reino distante, que rouba dos ricos para dar aos pobres.

No reino de estranhos, o velho Kassim é um dos maiores proprietários de terras emersas e submersas da região até onde o olhar perde a visão; Agnus Dei, como é conhecido o guardião do Livro dos Sete Selos ou das Horas, outro que possui pequenos reinos dentro de um reino maior, que também está contido no interior doutro e assim sucessivamente; por fim, Don Borja, um jovem e valoroso concorrente dos demais...

Prodigal, que desconhecia seu passado, veio seguindo os passos firmes e fundos do cavalo de Drago por aquela terra de areias brancas, encontrando aquele corpo imenso e sem vida na beira do lago Azul Profundo. Sozinho por breves instantes que pareceram horas, dias, não teve forças suficientes para movimentar àquela pesada armadura. Somente quando a mulher das águas, chamada Insônia, submergiu de seu mergulho noturno, foi que tudo pareceu mudar. O tempo passou a cair na imensa ampulheta das horas, e uma chuva fina, misturada com o vento, deu a ele a fantasiosa impressão de chover areia sobre ambos...

Insônia trazia na mão um cantil cheio de água para reanimar Drago, mas este não estava mais ali, sua alma dura havia partido para o grande vale das sombras, que todos irão um dia visitar. A bela mulher, então, pôs a mão esquerda sobre o ombro direito de Prodigal, que ajoelhado próximo de seu Senhor, tentava a todo custo conter uma pequena cachoeira interior, querendo desaguar. O jovem dizia dezenas de vezes para si mesmo: Escudeiros não devem fazer isso! Insônia, ajoelhada também do seu lado, como que em oração, disse apenas: O caminho de um rio ninguém pode barrar, e se assim o fizer, terá sucesso passageiro, pois um dia, é a lei da natureza, irá tudo transbordar. Não fuja da natureza, seja você mesmo e não o seu Outro.

Aquelas palavras caíram dentro do poço fundo do escudeiro, fazendo o barulho de pedras mergulhando na água, e surgindo círculos concêntricos, um após o outro... O jovem virou-se para a mulher e perguntou seu nome. Insônia respondeu de imediato com outra pergunta: De que adiantam os nomes se as palavras não dão conta dos símbolos que as coisas encerram em seu interior? O Sol poderia ser chamado de moeda de ouro e a Lua de moeda de prata e mesmo assim não deixariam de ser o que são, não concordas? A beleza e a estranheza daquela moça do lago fizeram Prodigal não saber o que responder. Se tivesse em seu poder O Livro do Destino, quem sabe, teria a resposta para tudo na vida, da mesma forma que Lord Drago tinha em sua grande jornada interior... Pelo jeito, o menino do lago, com o encanto quebrado e aparentando quase a idade que deveria ter, aprenderia muito com a natureza, antes de vestir a escura armadura de seu Senhor...

sábado, 6 de setembro de 2008

O sol irradiava um calor imenso...

O sol irradiava um calor imenso, a mãe do garoto batia sem parar na porta de seu quarto, ele acordara em um pulo, e logo chegara à mesa da cozinha, o café já estava servido e a empolgação de sua mãe tomava conta da casa, menos o seu pai, continuava com a cara de poucos amigos e parecia que havia chorado durante toda a noite. Frutas e café, o garoto sentira que as próximas semanas seriam apertadas, tomou seu café, comeu uma fruta e foi até seu quarto, ao pegar a bola de cristal viu a moça de branco dormindo, mas o mar dentro da bola estava revolto, e a moça deitada na praia parecia em um sonho tranqüilo. Saiu correndo para ver o mar, gritou lá de fora para seu pai, e disse que naquela manhã o ajudaria com a pescaria. Ele chegou correndo no barco de seu pai que aparentava não estar com muita vontade ao carregar a rede. Saíram ao mar, o garoto muito entusiasmado, e seu pai com ar carrancudo... já não eram mais visíveis ao ponto da beira da praia...

Ao início da tarde estavam de volta, o garoto aparentava estar muito feliz, e seu pai também, o barco estava transbordando de tantos peixes, o mar fora generoso naquele dia. O menino gritava estridentemente chamando sua mãe, queria contá-la que aquele dia teria um sabor especial...

O almoço fora feito a partir das tainhas pescadas, na brasa, estalavam cada gota de gordura que caía, o apetite aumentava a cada instante, todos estavam à mesa conversando, a mãe, a irmã, o cunhado e seus pais, enquanto o pequeno e seu pai preparavam o almoço e os peixes para vender na feira do reino... tainhas assadas, e a mesa se transformou em um recanto de paz e silêncio, todos se deliciavam com o peixe delicioso que o mar os presenteara.

Antes de partir para a feira, o garoto passou em seu quarto e espiou a moça de branco dentro da bola de cristal, o mar em seu interior estava calmo e ela apreciava as ondas, suspirava e irradiava um brilho quente em seus olhos, ele conversou um pouco sobre o olhar dela e avisou que voltaria mais tarde, ela sorriu e o desejou uma boa venda de peixes na feira.

Ao caminho da feira com seu pai, o menino pensou por um instante, como ela me desejou boas vendas, se não lhe contei dos peixes... na feira os clientes, apreciavam as tainhas que ali estavam expostas, muito grandes e gordas, fresquinhas com um aspecto mágico. O garoto vendia enquanto seu pai conversava com os outros feirantes, trocava peixes por outros alimentos e temperos nobres que vinham de muito, muito longe, mas que eram muito apreciados pelo rei.

A noite chegara e a feira havia terminado, eles voltavam para a casa satisfeitos, com sacos cheios de alimentos, e com os bolsos lotados de moedas reais, as moedas de ouro pesavam demais, mas seu peso não espantara tamanha alegria de toda a família na chegada, ainda estavam todos lá, combinando o casamento da filha mais velha, enquanto pai e filho descarregavam a magia que aquele sol trouxera naquele dia.

sábado, 30 de agosto de 2008

Pequeno mundo pequeno

Todo estrangeiro é um estranho em uma terra que não é a sua. Terra mais estranha ainda para quem está chegando ou só de passagem. Se cada pessoa contém um pequeno universo interior, um Reino de estranhos carrega em si diversos mundos e pessoas, cada um com suas luzes e sombras, suas espadas e cruzes em uma longa jornada.

Prodigal – um estrangeiro que causa estranheza por onde passa -, diante do corpo sem vida de Lord Drago, seu amo e Senhor, não sentiu-se mais sozinho no mundo, pois a solidão tem sido a sua eterna namorada e companheira de viagem desde sempre. Naquele instante de dor um vácuo contornou seu corpo e o silêncio ficou agachado ao seu redor...

Mesmo Lord Drago tendo sido quem o criou, quando sua mãe Alma morrera sem ninguém esperar e sua tia Vida enlouqueceu sem explicação, aquele cavaleiro era para o fiel escudeiro uma grande incógnita e um quase desconhecido. Imenso, em sua armadura negra e alma dura de tanto guerrear pela bandeira dos outros, vivia o Lord envolto em mil e um segredos e medos. Frio e distante, às vezes, como uma muralha intransponível, noutras cândido e fraterno como um peão, o jovem pouco sabia da vida de seu Senhor, apenas que todo cavaleiro do dragão negro – e já foram muitos desde o início dos tempos – deveria zelar pela Irmandade do Vento; um grupo de cavaleiros que combatia a temível Ordem do Tempo... Entre as poucas coisas que Drago lhe contara estava o fato de que todo cavaleiro da Irmandade do Vento precisa, antes de sair em longa jornada, escolher o fiel escudeiro, para que ao morrer em batalha este o substitua e continue o mito de sua imortalidade. Era o pacto feito entre amo e servo, desde o início dos tempos da irmandade... Dessa forma o escudeiro era iniciado n'A grande verdade, sabendo que um dia O Livro do Destino teria que ser por ele guardado com a própria vida.

Prodigal sabia que Drago era o sétimo cavaleiro da irmandade do Vento, e que quando ele morresse deveria procurar um dos seis restantes, que conheciam cada um mais seis nomes de cavaleiros, e estes mais seis e assim por diante, na grande teia de aranha do brasão daquela comunidade secreta, que se reunia vez que outra num local remoto, para escrever enigmáticos poemas em forma de criptogramas, que só os integrantes d'A Grande Teia podiam entender... Os seis cavaleiros eram: Capablanca, Luminet, Morphy, Binet, Steinitz e Groot. Tinham outros, como Sessa, Philidor, Shannon, Damiano, Filguth, Polgar e Fine, mas esses o escudeiro - um iniciado nos segredos da Grande Biblioteca Universal, do mago Borges, como Lord Drago também se referia à irmandade do Vento - desconhecia a existência. A cada sete cavaleiros estes só conheciam um degrau além do que estavam, e o outro assim por diante, de forma a manter aquela pequena legião de guerreiros longe das perseguições da Ordem do Tempo, que como o próprio nome demonstrava, desejava controlar a qualquer custo o tempo e o vento... Esta ordem tinha como insígnia uma imensa ampulheta com um gigante de um olho só aprisionado em seu interior.

O escudeiro ajoelhado ao lado do corpo de Drago – pensando em quem deveria escolher para seu fiel escudeiro - viu uma pequena concha flutuando ao redor. Ao pegá-la com a mão esquerda e levá-la ao ouvido, por conta de um estranho ruído, descobriu que a tal concha parecia conter em seu interior o som de uma diminuta gruta escura e funda em que sua mãe Alma dizia que seu verdadeiro pai Sem Nome tinha se perdido para sempre, num pequeno labirinto construído por ele mesmo e que de lá jamais se encontrara tampouco retornaria ao mundo dos vivos... Se aquela concha podia carregar dentro de si um pequeno pedaço de mar, Prodigal passou a acreditar piamente que aquele Reino de estranhos poderia estar encerrado dentro de uma pequena bola de cristal, como que se o particular pudesse conter em si o universal...

quinta-feira, 28 de agosto de 2008

The darkest things


Could you imagine how mysterious this kingdom could be? Princess, queens, soldiers, thiefs and enigmatic girls...this story is about don't know nothing about what will happen.

Besides the Castle, some kind of building very strange was contructed at that small village. A kind of vault or something like that all underneath the soil. But when people come inside, can feel like they were at your own home. Big walls, doors, rooms. All that you can find in a house.

But in these walls were written some kinds of drawing...pieces of flesh, dead bodies and stuff like that.

"I have to run out of this place". She thought. Then she ran up to the stairs and finnally found a way out of that mysterious place. That's when she met that Soldier that came to confuse her mind and be the one to find out what was really hapenning in that place.

Who is behind all these misteries? The queen? The little thief? Sidelar?

Who knows? Who will know?

sábado, 23 de agosto de 2008

O pequeno ladrão de frutas e sua bola de cristal


Lá estava ele, e a menina a espreita chamava o menino rapidamente, ao entrar pela passagem o menino sentiu um enorme frio na barriga, sentia que aquela noite seria decisiva e só restava libertar a moça linda e de branco que estava presa na bola de cristal, não havia nenhum sinal de pessoas por aquelas partes do Castelo, e ele sentiu-se seguro quando abriu a porta do aposento, a bola quietinha em um canto, e a moça dormia, ele pegou a bola e a colocou dentro de um saco, como se estivesse roubando alguma coisa, olhou para os lados, observou bem aquele lugar e pensou que jamais voltaria a pisar dentro do Castelo e não veria coisa mais bela que aquele quarto. Ao sair do Castelo sua amiga o desejou boa sorte e ele foi embora feliz e com medo.

No caminho do bosque a noite estava tranqüila, as folhas das árvores pareciam cantar com o vento que soprava, no meio do caminho escutou um bocejo vindo de dentro da bola, sorriu e mesmo sabendo que a linda moça acordara continuou andando. Após alguns momentos escutou ela resmungar:

- Onde será que estou? Será que me acharam? Ó meus céus e meu mar, está tudo escuro e balançando! O que será de mim?

Ele parou, e abriu o saco com um sorriso enorme nos dentes tranqüilizando a moça e dizendo que ela estava a salvo, que não demoraria muito para que chegassem em sua casa, mas ela deveria ficar quieta e calma, pois sua família não poderia vê-la e nem desconfiar de algo errado com ele, porque ele já havia aprontado demais, e mais uma vez, sua mãe ficaria muito chateada.

Chegando perto de sua casa, o menino recolheu a bola para dentro do saco, e ao entrar em casa percebeu que algo não estava muito bem. Estavam todos reunidos na cozinha e cochichavam de modo que quase nada se escutava na entrada, seu pai, sua mãe, sua irmã mais velha e um rapaz, o qual era vizinho deles, todos sentados em volta da mesa, o menino passou depressa para o seu quarto, largou o saco embaixo de sua cama e pediu para a jovem esperar. Ao entrar na cozinha a conversa cessou, e ele perguntou o que ocorrera, sua mãe o pegou pela mão e o colocou em seu colo, explicou que o vizinho havia pedido sua irmã em casamento e que em breve suas vidas seriam melhores. O menino ficou um tanto surpreso com a notícia e felicitou sua irmã pelo pedido e desejou boa sorte aos noivos, seu pai estava com uma cara não muito feliz, e era notável sua má vontade em aceitar o pedido da mão da filha em casamento, sua mãe estava super empolgada e nos olhos da irmã, lágrimas de felicidade escorriam sem parar.

Sua mãe o mandara para o quarto, já era tarde e no dia seguinte começariam os preparos para o casamento de sua irmã, o menino foi mais que rápido, trancou a porta e pegou o saco com a bola de cristal, contou para a moça de branco que sua irmã se casaria em breve e que a felicidade tomara conta da casa, a moça pareceu sorridente e logo o questionou:

- Quando vou sair daqui? De dentro desta bola de cristal?

Ele não soube o que dizer, há alguns dias atrás vendera o pó mágico que pegou da sala do Mago, só havia um pouco que tinha guardado dentro de uma caneta que estava escondida.

Ela se lamenta:

- Estou há muitos anos aqui dentro, o cheiro de mar que sinto está me revoltando, aqui eu não como, não tenho vontade de me alimentar, apenas penso, canto e espero o dia em que virá alguém me libertar.

Ele explicou que já era tarde e tinha que dormir, pediu para que ficasse calma, pois era muito difícil para ele, queria libertá-la, mas ainda não sabia como. Desejou-lhe boa noite e foi dormir.
Observação: Imagem acima, ilustração de Jouber D. Cunha, feira especialmente para o RPG.

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

O menino do lago

No Azul Profundo, a alma do cavaleiro pouco a pouco foi mergulhando...

Na beira do lago interior, o mundo começou a ficar gelado demais, espelhado naquela vida sem sentido. Dentro do Azul Profundo havia um sono igualmente íntimo, intenso, atroz... Naquelas águas frias, o corpo daquele cavaleiro imenso boiava num mar celestial...

Próximo ao bosque, o escudeiro do Dragão Negro esperava que aquela escuridão total cessasse para que ele pudesse reencontrar seu amo e Senhor. Criado por Lord Drago, o jovem Prodigal nunca conhecera seus verdadeiros pais. Desde menino fora ensinado a ser um leal servo do cavaleiro imortal. Seu verdadeiro nome desconhecia. Prodigal era um nome de guerra, como outro qualquer. Seu dever era sempre manter a chama dos dois escudos no céu, arremessados pela catapulta secreta, para que os valentes de qualquer reino temessem a chegada de Lord Drago.

Era noite dupla, no tempo e no espaço. Noite dupla nas horas e no céu. O eclipse era sempre considerado um mau presságio para os homens da realeza e também da plebe rude. Mas ele, que fora educado pelo cavaleiro do dragão negro, conhecia algumas das diversas coisas entre o céu e a terra, a partir das leituras feitas por Drago de um misterioso livro, como se fosse um oráculo: O Livro do Destino. Encontrado na tumba de uma múmia, o manuscrito muito antigo continha algumas perguntas e possíveis respostas. Seu uso dependia do bom jogo dos três dados mágicos que acompanhavam o texto milenar. Ao pensar com força em uma pergunta ou desejo, deveria o leitor jogar por sete vezes tais cubos mágicos, anotando seus resultados em uma árvore próxima, na areia, em qualquer lugar. Para cada combinação de arremesso de dados, se fosse par representava um sol, se fosse ímpar uma lua.

Quando seu Senhor jogou pela última vez os dados mágicos, a resposta à sua pergunta secreta teve o resultado de três sóis e quatro luas... A visão do semblante de Lord Drago, após ouvir do oráculo seu destino impressionou muito Prodigal. Nesse instante tinham passados exatos três sóis e três luas no céu. A quarta lua foi justamente a noite dupla encobrindo o Reino de estranhos de um jeito sem igual...

O jovem então, temendo pelo destino do cavaleiro, fez que seu cavalo e a montaria reserva de seu Senhor puxassem a catapulta até as margens de um estranho lago, formado de quando em vez pela força das águas de uma misteriosa Nuvem Passageira que cobre o céu do Reino de estranhos, toda vez que naquele curioso local há a programação de alguma festividade. Toda vez que tais festas religiosas ou pagãs acontecem por ali, cães e lobos surgem do nada, entre as pessoas, trazendo mau agouro aos habitantes da região...

Prodigal, na escuridão daquele tempo, foi então seguindo a margem do lago interior, vendo ao longe o brilho de um pequeno farol. Quando se aproximou da luminosidade, tratava-se somente de uma pequena tocha, cravada no solo, enquanto uma mulher de beleza rara, algo sobrenatural, emergia das águas, com seu cantil cheio, caminhando em direção ao corpo desfalecido de seu Senhor. Reconheceu-o, apesar da escuridão, por conta de uma pedra vermelha em seu peito, o famoso diamante Coração do Dragão, que o cavaleiro negro ostentava com orgulho e bravura a cada batalha vencida.

Insônia era o nome dado a mulher que trazia em seu cantil a água das profundezas do lago, para tentar salvar o guerreiro ferido de morte de seu Destino atroz.

Prodigal percebeu as pernas alvejadas de Lord Drago, mas o que de fato o matou foi um pequeno e afiado dardo, cravado bem fundo no coração do dragão. O jovem, ao primeiro instante não reconheceu a mulher, mas esta lembrou-se do menino do lago no exato segundo que o viu. Alguém por quem ela tinha grande afeição, diversos sóis e luas atrás, quando ambos eram muito jovens. Insônia - que quando menina desconhecia seus poderes, herdados das mulheres dos bosques - pediu num passado distante, quando da primeira vez que conheceu o menino, que este jamais envelhecesse até que ela pudesse reencontrá-lo. Este dia, na lei do eterno retorno chegou, e era para ela hoje, agora, já... Aquele pacto com as águas estava cumprido, e de agora em diante a juventude de Prodigal não seria mais a mesma... De volta à fonte da juventude, o jovem que jamais envelhecia teria que guardar em seu cantil muita água daquele lago se não quisesse envelhecer de uma vez só todo o tempo que lhe fora poupado pelo próprio tempo, por conta da afeição, do encanto e do encantamento daquela bela mulher...

Quando o jovem pisou de novo no lago, sem saber, quebrara o encanto do tempo. Mas outro encanto entre ele e Insônia mal estava para começar... Nenhum dos dois dissera uma palavra sequer. Nos olhos de cada um aquela sensação de déjá vu estava impregnada no ar, em seu entorno a bailar... Entre os dois, apenas o lago e o corpo sem vida de Lord Drago. A volta gradual do brilho da Lua trouxe de novo a todos os habitantes do Reino de estranhos o falso encantamento, e a certeza a Prodigal e Insônia de que tanto o real como o imaginário só o lago podia conceder ou retirar, velar ou desvendar...

Observação: Imagem acima, criada especialmente para o RPG, por Jouber D. Cunha.

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

Rei Branco: a alma turva e a revelação

Tarde cinza e o Rei Branco contemplava os bicos lustrados das botas e deixava solto o pensamento:

- Malditos, miseráveis, bichos pestilentos! Não sei quais as razões de tão profunda repugnância, de tanto nojo. O meu lugar nobre, imenso por si, parece pouco diante desse sentimento atroz que nutro pelos inferiores, mas confesso a mim que esse desprezo me alegra. O poder. O poder. O poder é a minha varinha de condão: não há pagamento de impostos? Masmorra! Não louvou meu Deus-pai-todo-poderoso? Forca em praça pública para dar o bom exemplo! Não rendeu-se aos meus apelos de macho e de superior? Tortura! Cortem as unhas a facão, arranquem os cabelos aos puxões, quebrem os dedos com quilos de chumbo e façam engolir os cacos de vidro enquanto ainda houver voz audível! Porque eu sou a lei e obedeço a vontade do Supremo-pai-celestial, que me investiu de realeza e de inteligência e de..

- Irmão! Amado, irmão! Vi com a clareza do espelho dágua que cobre o rio, Grande, que nos abastece, ó rei, vi nuvens densas e negras, negras e sangue, negras e dor e destempero, ó rei. Eu vi e desejaria mil vezes não ter esses olhos íntimos de ver o invisível e não saber dessa terrível desgraça que já se aproxima de vossa cabeça, ó rei, ó rei!! Como sou infeliz!

- Do que falas, homem de Deus? Tua clausura e teus delírios de orações te moeram os miolos? Nunca houve majestade mais próspera na história desse reino de estranhos, a Dinastia perpetua-se há vários ciclos e não dá mostras de fraqueza. As lavouras tiveram menor rendimento, é verdade, mas os camponeses não furtam sequer um décimo da produção das minhas terras, o gado pode ter emagrecido, mas o leite produzido sobre o meu chão ainda retorna, gota por gota, aos meus cofres, e não há homem nobre o suficiente para fazer-me qualquer tímida oposição. Do que, então, falas, homem de Deus, feito burro aos relinchos?

- Ó rei, é dos céus e das entranhas do povo que a desgraça ameaça abater-se sobre vós. Da magia, dos feitiços milenares dessas bruxas e magos primitivos. Dessas danças demoníacas, dessa música infernal e do fogo vem vossa derrota. Eu vi. Primeiro irás perder todas as riquezas da matéria, o trigo, o boi, a moeda... Depois, os nobres abaixo de vós irão virar as costas e sumir no espectro de vossa confiança. Então a revolta inflamará a plebe, e uma onda de rebeldia incendiará vosso reino, ó rei, é desesperador, mas o pior ainda não é isso! Não é isso... O pior, ó, amado irmão, meu rei, o pior virá quando estiveres só e juntando os pedaços do orgulho real.

Nesse dia derradeiro ouvirás uma voz branca legítima vestida de negro. Do sussurro aos berros essa voz revelará fraquezas impensadas... e depois, e depois, e depois, ó, é terrível!

- Dize, infeliz, que já nem sei se sofro ou se rio do teu pavor...

- Depois a loucura, meu irmão, essa cobra verde-escura, a insanidade vai corroer o trono, o manto, o sangue e o pensamento e nada mais te sobrará. Implorarás a chegada da morte redentora, tamanho o sofrimento que vos irá dilacerar!

Contam que o bispo, branco, correu feito o vento para fora das dependências do Castelo de Messiter, enveredou pelos campos de trigo gritando "É terrível! Ó Deus! O rei está morto" e por algum tempo não foi visto por aquelas bandas.

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Algum tempo depois...

Dentro da bola de cristal a moça em seus trajes brancos dormia como um anjo, lá fora o animalzinho parecia cansado e por ter esperado tanto tempo sua musa acordar para rolar a bola por entre suas patas, resolveu ir embora e sumiu atrás do biombo vermelho com detalhes em dourado, que remetiam a uma brisa imensa de ventos de ouro no canto do quarto. Este aposento da ala secreta do Castelo de Messiter era de um bom gosto espetacular, com mistura de vermelho, rosa, branco e panos transparentes em volta da cama, as cortinas pareciam véus e detalhes dourados preenchiam a beleza natural que tomava conta do quarto, o efeito quente que tinham as cores subliminavam um ambiente pesado e tranqüilo, a beleza e o amor, o fogo e as rosas.

Já havia passado muito tempo desde que o menino manteve contato com a moça de branco, ele estava preocupado, pois não conseguia entrar no Castelo, os soldados continuavam rondando o Castelo e o Mago estava muito aflito, aquela bola representava o seu poder e seus segredos, todos estavam guardados dentro dela, sua agonia era tão grande que ele estava prestes a fugir do reino e abandonar a tudo que havia conquistado, não pelo perigo que a bola representava, e sim a quem a descobrisse, por seus segredos, quem estivesse com a bola poderia acabar com ele e de qualquer forma o Rei o mandaria embora ou o mataria em cerimônia especial para todos aprenderem quem mandava naquele reino de estranhos.

O garoto estava na função ao final da feira do reino recolhendo o que era bom para levar à sua casa, e já havia levado um saco cheio de frutas que antes pegara sem ninguém ver, sua família era muito pobre e seu pai um pescador não muito sucedido, ultimamente o mar não estava para peixe e tudo que vinha do mar era para o alimento de casa, há tempos seu pai não conseguia nada de bom para vender na feira. Um grito de longe chamou a atenção do jovem, sua amiga, filha da cozinheira do Castelo estava logo atrás do homem que gritava em bravos o preço de algumas frutas, ela o viu e chamou-o fazendo sinal para que ele a encontrasse na floresta. Após algum tempo lá estavam eles, conversando e ele muito preocupado, pois havia prometido tirar aquela moça de dentro da bola, e mais espantado estava, com o que o Mago havia falado, que quem a olhasse ficaria cego, e a ele e ela nada disso havia acontecido, no entanto, a marcação cerrada da guarda do reino não o deixara mais entrar lá, e novamente combinou com sua amiguinha que durante a noite, nas 22 badaladas do Castelo de Messiter, estaria lá, no mesmo lugar para levar de vez aquela jovem de dentro do aposento.

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Confessionário

Não é que fosse rebelde. Não é que o mundo fosse grande, com paredes invisíveis. Não que o ar pesasse ao passar por suas narinas. Não era isso. Não era essa negação e toda hora dizer não.

Simplesmente pairava no ar uma dúvida...uma dúvida cruel que estava surgindo em sua mente.

Quando fazia parte da sua seita secreta (que já tentara esquecer por tantas vezes), sentia-se um pouco melhor do que agora, sem as correntes.

Agora, corria atrás de um par de olhos sem dono. E pensava nele...Valeriano, seus olhos cor de mel, cabelos loiros, quase branquinhos. Pensava nesses fios como sendo raios de sol. De repente fecha os olhos e sente como se precisasse adormecer para esquecer. Esquecer que estava fugindo do nada para lugar nenhum. Esquecer que não podia lembrar do soldado. Não poderia lembrar do arfar da sua respiração...não, não. Queria esquecer imediatamente Valeriano e suas palavras meigas, suas promessas de que tudo seria para sempre.

Sentia-se tão frágil...mesmo não tendo o direito de sentir-se assim. Ela era Vênus. Vênus de La Luna. Saída de uma concha redonda mergulhando profundamente no mar do mundo. De mistérios, de amores, de segredos, de vazio. De encantos. De sentimentos femininos viscerais. Era ela. Era Vênus. Coração, razão, verdade, convicção. A princesa de Valeriano e a perdição do Soldado inominado.

Era a dúvida...vivia de dúvida agora.

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

O cavaleiro do dragão negro

Luzes e sombras se digladiavam naquele reino de estranhos. No céu duas luas, em formação de móbile, apareciam e se escondiam entre nuvens espessas, enquanto dois escudos de fogo sobrevoavam o castelo sem emitir som. O disco lunar duplo era fruto do eclipse que se formara entre o céu e a terra... A Lua Nova que se tornava Crescente, de repente, fora eclipsada por outro corpo celeste de maior proporção. E o que acontecia no céu, parecia ter paralelo na terra, entre dois corpos humanos se procurando nas trevas daquele tempo perdido, dentro de um bosque encantado, onde diversas mulheres da misteriosa seita da Lua Prateada dançavam descalças em torno de uma chama que parecia vir, ora do interior da terra, ora do interior delas mesmas. Eram todas consideradas “bruxas” pelos soldados do castelo de Messiter, desconhecedores de suas identidades, e que do alto de uma das torres ficavam entre extasiados e perplexos com aquele estranho ritual. Havia a crendice de que toda noite de Lua Nova era propícia para o surgimento de dragões que podiam engolir a própria lua e toda luz do céu. Diziam que era um período para o surgimento de monstros e desaparecimento de gentes.

Toda vez que ocorria um eclipse lunar, aquele reino se dividia em dois mundos diversos: o dos que eram da luz e dos que continuavam nas trevas. Como peças de um tabuleiro mágico, haviam peões, cavalos, torres, bispos, reis e rainhas de lados opostos, em um jogo de claros-escuros, não em relação às cores de pele ou de roupas, mas de almas, que num futuro não muito distante levariam aquele reino de estranhos ao confronto final entre o povo das trevas e o das luzes... Entre espadas e cruzes...

Quando da Lua Nova, uma região não iluminada do disco lunar, não visível ao olho humano, fazia naquele reino que as pessoas mostrassem o seu lado oculto, muitos deles prisioneiros de sonhos e pesadelos, segredos e medos. Durante trinta dias quatro luas se revezavam no céu, cada uma incidindo sobre as pessoas, principalmente as mulheres e, em especial, às da Lua Prateada, que durante quatro noites de mudanças celestes se reuniam para cultuar e cultivar curiosas tradições e ritos de passagem.

Foi naquela noite em que os dois escudos de fogo cruzaram o céu sobre as torres do castelo, desaparecendo por entre densas árvores do bosque, que surgiu próximo a ponte elevadiça um cavaleiro montado em um corcel escuro, ambos vestidos de preto, estando o cavaleiro com espada brilhante em punho na mão direita enquanto que no braço esquerdo um escudo trazia estampado um dragão negro cuspindo fogo pelas ventas e em torno dele a misteriosa inscrição Nessun Dorma. A guarnição do castelo, supersticiosa e petrificada de medo ficou de prontidão... Ninguém saiu das muralhas para interpelar o misterioso e imenso homem, que o elmo não permitia enxergar os olhos.

Quando o eclipse cobriu enfim toda a Lua no céu, na terra dos homens, a escuridão foi total, e os soldados apavorados começaram a cuspir flechas e mais flechas em direção ao Dragão Negro, como fora batizado por um dos jovens arqueiros. A noite era serena, mas uma chuva oblíqua de setas desceu rumo ao chão. E o cavaleiro do dragão no escudo, apesar de tentar proteger os órgãos vitais, teve as pernas alvejadas, tombando junto com o cavalo... O animal, sem a mesma proteção, morreu na hora. O cavaleiro arrastou-se pela terra, perdendo muito sangue por conta dos ferimentos em ambas as pernas. Seu fiel escudeiro, um jovem criado seu, que sempre acionava a catapulta, projetando dois escudos flamejantes ao céu, para anunciar sua chegada e inibir a coragem de seus adversários, estava muito longe do local, e só chegaria ali tarde demais...
Então, o cavaleiro de um reino distante, arrastou-se até onde suas forças levaram seu corpanzil, deixando um rastro vermelho em direção à beira daquele grande rio que era mar, e que circundava todo o reino de estranhos. Ali, do outro lado da margem do rio quase imóvel, viu a silhueta de uma bela mulher, chamada Insônia, vinda das águas, emergindo de seu banho noturno renovador. Pensou no início tratar-se de alucinação, tal a beleza morena da mulher, que era tida como bruxa por uns e a fada por outros. Tardiamente e pela primeira vez na vida, ele o cavaleiro imbatível, que sempre curou todas as feridas de batalhas, e tinha fama de invencível, sentiu de imediato o peito ser traspassado como que por uma espada mágica, diante da aparição da belíssima mulher que lhe tiraria o desejo de dormir se os ferimentos não fossem um tormento profundo. Antes de desfalecer na dor e mergulhar no torpor, ficou com a dúvida atroz: Seria aquilo de fato uma visão ou pura e mortal alucinação? E pela derradeira vez, lavou o rosto suado no espelho das águas plácidas, que por segundos refletiram seu rosto de quando jovem. Em seguida o eclipse interno carregou sua alma para o grande vale das sombras e do sono...
Observação: Imagem acima, criada por Jouber D. Cunha, especialmente para o blog RPG.

terça-feira, 5 de agosto de 2008

Dia seguinte...

No dia seguinte o pequeno ladrão de frutas não conseguiu entrar no Castelo de Messiter, sua amiguinha havia avisado que estava muito difícil, pois os guardas estavam procurando a bola de cristal, e revistavam todos que entravam e saiam do reino, assim era muito arriscado a sua entrada. O mago estava muito intrigado com o sumiço da bola de cristal e todos do reino também, pois quem olhasse para a bola ficaria cego. Todos se perguntavam o que teria de tão triste nesta bola de cristal, e porque fazia tanto mal a quem a olhasse, o reino estava em estado de alerta, e os guardas estavam ansiosos em cumprir mais esta missão.

Enquanto isso a bola de cristal rolava de um lado para outro e sua única companhia era o animalzinho esquisito que a rondava e brincava sem parar, a moça não suportava mais até que pediu para parar, e o animalzinho parou e ficou olhando para ela firmemente. Então ela achou muito estranho, um animalzinho esquisito e que entendia o que ela falava, pôs-se a falar, e a recitar alguns poemas, ele a encarava mais de perto e parecia gostar de todas as coisas que ali ouvira.

A moça estava muito triste, fazia muito tempo que o menino não aparecia e ela ficava cada vez mais preocupada, pensou em várias hipóteses, teria ele descoberto o que se passava com ela, ou esquecera que havia prometido libertar ela daquela bola de cristal, ela não acreditava nas coisas que pensara e acabou adormecendo em meio as suas preocupações...

terça-feira, 29 de julho de 2008

A grande verdade


Em um cenário de pobreza vivia Valeriano, sua vida resumia-se a cuidar da pequena plantação de onde tirava o suficiente apenas para se alimentar.

Fazia duas semanas que a tragédia havia ocorrido. Era um dia frio, chuvoso e Valeriano, como de costume, estava cuidando à horta. De repente viu ao longe sete soldados do Rei se aproximando com espadas a punho. Escondeu-se em meio à pastagem alta e dali viu invadirem sua casa e escutou gritos desesperados de sua família. Valeriano já sabia o que estava acontecendo, havia rumores que seu pai Ciprus era um feiticeiro e estava perto de desvendar “a grande verdade”, isso provavelmente despertou a ira do Rei. Ninguém nunca soube explicar o que seria essa tal “grande verdade”, porém o Rei sempre achou melhor tirar de seu caminho qualquer pessoa que pudesse colocar em risco seu reinado absoluto.

Com frio, fome e tentando de todas as formas, sobreviver às recordações daquele dia infeliz, Valeriano vestiu a longa capa negra que seu pai costumava usar e saiu para dar uma volta pela região. Andou em direção a um morro, lá via todo vilarejo pobre e o enorme castelo ao fundo. Sentou-se numa pedra e ficou ali por horas. Só, só com seus estúpidos pensamentos. Afinal, iria pensar em quê? Ali do alto só enxergava pessoas morrendo de fome, ódio, desesperança. Nunca desejou ou fez o mal. Por que a vida estava sendo tão cruel com ele? Envolto nesses pensamentos acabou adormecendo ali mesmo.

Sonhou que estava em um lugar fechado, escuro, vazio, gélido. Enxergava ao longe a figura de seu pai vestindo sua longa capa negra, sua aparência era boa e o velho parecia desenhar algo no ar. Valeriano tentava correr para alcançá-lo, mas vultos agarravam seus pés e ele jamais conseguia chegar até ele. Seu pai mostrava-se muito calmo, parecia que tinha algo muito importante para dizer, mas entendia que o certo seria deixar seu filho descobrir sozinho. Valeriano acordou, levantou-se assustado e correu de volta para sua casa. Relembrava de cada detalhe do sonho. O que seu pai queria lhe dizer? Ao retirar a capa negra notou algo diferente, havia alguma coisa dentro do forro daquela capa. Valeriano resolveu verificar o que era, retirou a costura cuidadosamente e lá encontrou um papel envelhecido pelo tempo que continha algumas palavras e um desenho que não conseguia identificar, pois nunca havia visto nada parecido.

“Na escuridão a luz brilha mais forte
Entenda que vida segue com a morte
Se o meu pesadelo contém uma negra veste
É porque luto com a espada celeste
A grande verdade será revelada

Assim que um coração puro encontrar a espada”

Observação: Imagem acima, desenho de Jouber D. Cunha , feito especialmente para o RPG.

quarta-feira, 23 de julho de 2008

Os olhos de Cristal


Sentada em sua cama, a princesa Cristal põe a ditar para seu escriba O Livro dos Sonhos, em que retratava ora em prosa, ora em verso as imagens que via a cada noite mal dormida. Curiosamente eram formas que ela não compreendia, pois Cristal fora batizada com esse nome por conta da falsa imagem que deu ao seu pai, o rei Palermo, quando a viu nascer. Encantado com a beleza da menina, de cabelos loiros quase brancos, e olhos igualmente claros como o cristal, o pai orgulhoso não pensou duas vezes em dar-lhe esse nome.

O rei severo, com o tempo passou a perceber que algo estava errado com os olhos da menina, que não encaravam o seu rosto barbudo, quando este a pegava no colo para brincar. Intrigado, um dia colocou a filha diante da janela de seu quarto, numa manhã de sol forte. E ai descobriu que a princesa, tão bela, não possuía visão. Cega de nascença, naquele reino jamais poderia enxergar o que se passava a sua volta. O que seria lamentável para uma nobre.

Então, o rei confinou a menina em uma das torres do castelo, como que presa numa bolha, até chegar aos 16 anos, quando passou a ser cortejada por príncipes de reinos distantes, que a viam apenas de longe, maravilhados por sua beleza, mas intrigados por ela nunca olhar nos olhos de alguém... Ninguém naquele reino sabia de sua cegueira, exceto o rei, a rainha e alguns serviçais...

A maioria dos pretendentes, diante do insucesso de conhecê-la de frente, desistia do pleito e retornava para casa, e os que insistiam junto ao rei para conhecer Cristal pessoalmente, só podiam assim o fazer mediante uma condição: jamais encarar seu rosto, antes do casamento. Ninguém aceitava tal proposta e todos saiam indignados com a crueldade do rei Palermo. Dois longos anos se passaram... Outros pretendentes vieram, e todos tiveram o mesmo destino...

A rainha de nome Esperança, em decorrência do destino de sua filha e a truculência do rei, passou a ser chamada pelos seus súditos de Tristeza, vivendo confinada na outra torre, aguardando o dia que os sonhos da filha se tornassem realidade naquele reino de estranhos. Alguém que Cristal via em sonho todas as noites, e que viria libertá-las daquela prisão. A princesa tinha o dom de, apesar de não enxergar nada, conhecer as pessoas ao seu redor apenas pelo tom de voz e o jeito de caminhar. Imaginava seus traços, e quase sempre acertava na índole (boa ou má) de cada um, sabendo separar o joio do trigo, coisa que o rei Palermo, sempre rodeado de conselheiros, não possuía tal visão...

Por ironia do destino, naquele reino de estranhos, existia um bom homem, com medonha aparência, que encantava a todos com seus versos livres, mas que afugentava a todos que o conheciam pessoalmente. Um homem sem família, que vivia encapuzado, com um olho vazado por um duelo quando jovem, e que naqueles tempos, só saia de seu quarto, no interior do castelo, ao anoitecer, para não encontrar ninguém. Predileto do rei Palermo por conta de seus versos encarados como profecias, o Poeta vivia sozinho, recolhido em seu mundo interior. E nele tinha devaneios por conta do amor que depositava na princesa Cristal, que toda noite quando vinha à janela, emitia um misterioso brilho nos olhos, fazendo o Poeta se esconder entre as árvores, com medo de ser visto ali na espreita. Quando voltava para seu quarto, um pequeno poema ia nascendo em seu interior, na mesma medida que a princesa quando deitava, passava a sonhar com o homem que escrevia versos tão belos, quase profecias em que ela queria a todo custo acreditar...

Observação: Desenho acima, criado por Jouber D. Cunha, especialmente para o RPG.

sábado, 19 de julho de 2008

22 badaladas do Castelo de Messiter

Alguns instantes antes das 22 badaladas do Castelo de Messiter, o pequeno menino encontrava-se atrás de um arbusto aos fundos do Castelo. A noite estava calma, as duas luas pareciam confrontar-se no céu e os escudos de fogo passeavam tranqüilos cortando os desenhos das estrelas e das poucas nuvens que lá figuravam em um luar tranqüilo e assustador.
Dentro do aposento secreto a bola de cristal rolava de um lado para outro sem parar, passara assim desde a hora em que o pequeno a deixara sozinha, o animalzinho de cinco patas lampejava a volta da bola, brincava friamente e sem parar de balançar a moça dentro da bola. Não se sabe de onde surgiu, e a moça estava cansada e exausta de tantas cabeças para baixo, de andar de um lado para outro, de ver as paredes, a cama, os armários e o teto contrastando com o tapete amarelo, e rodava, rodava, rodava sem parar.
Badaladas anunciavam às 22 horas ao reino, como combinado com a filha da cozinheira, ela apareceu por um buraco ao lado do arbusto que o menino estava, e o chamou com rapidez, pois estava com medo, naquela noite, dos guardas. O menino pôs-se a rapidez e em poucos instantes passavam vagarosamente pelo túnel debaixo do Castelo. A menina contava ao seu amiguinho que o Mago havia posto o Castelo inteiro em estado de alerta com o sumiço de sua bola de cristal, os guardas tinham ordens de quando encontrar a bola, lhe taparem o mais rápido, pois quem a olhasse ficaria cego na mesma hora, e mais, quem estava com a bola seria sacrificado na masmorra do meio do bosque. Ao chegar no aposento secreto, o menino entrou e a menina ficou na espreita, escondida atrás da parede que dava ao túnel. A primeira coisa que ele olhou ao chegar no quarto foi para o canto onde havia deixado a bola de cristal, mas ela não estava ali, então, começou a procurá-la em todos os cantos do quarto, em pouco tempo escutou um barulho estranho debaixo da cama, era a bola de cristal, ele pegou-a e colocou sobre a cama, a moça estava desmaiada e com sinais de muito cansaço em seu semblante. Ele aguardou um pouco, tossiu duas ou três vezes e nada da moça voltar a si, pensou que estava morta por um instante, mas em seguida ela acordou e tomou um enorme susto com os olhos do menino grudados a bola de cristal.
Em um pequeno relance ele percebeu que algo havia se mexido no canto do aposento, e estava atrás do biombo o que ele vira passar correndo, pegou a bola nas mãos e suando bastante arrancou o biombo do lugar e não encontrou nada. A moça, no entanto, não estava muito satisfeita com a atitude do garoto que nem a perguntou se estava bem, ou o que havia acontecido, por sua vez ele olhava novamente para ela e a questionava:
- O que fizestes? Qual o problema? Como fostes parar ali?
Ela responde:
- Um animal peludo e estranho que nunca vi em minha vida, apareceu e começou a jogar a bola para todos os lados, comecei a me sentir mal, muito tonta e apaguei. Não o vi mais depois que desmaiei.
O menino ficou surpreso com o relato da moça, pois seu avô fora por muitos anos o Soldado do reino, mas a idade chegou e suas forças não eram mais as mesmas, na sua velhice o ex-soldado contava muitas histórias sobre o reino ao garoto, no momento em que ela relatou o que acontecera, ele lembrou de uma história que seu avô contava, a qual era a sua preferida, em que a feitiçaria de um povo muito antigo havia condenado algumas moças do reino a adorarem a lua e a esquecer dos amores de suas vidas, a cantiga que o velho cantava veio a cabeça do menino como um passe de mágica...

Moças, moças, moças...
São todas as moças,
Viram bichos muito sapecas,
E não largam de seus amores,
Eles pensam que são de estimação,
Mas as moças que estimam seu coração.

Após algum tempo ele escutou uma batida na porta, era sua amiguinha, ele abriu a porta e ela mandou que fossem embora, havia escutado um barulho no corredor, um pouco distante, ele pôs a bola de cristal no mesmo canto que antes e falou a moça que retornaria no dia seguinte e que arrumaria uma forma de ajudá-la. Ela por sua vez pareceu triste, e apenas deu-se com os ombros. Eles saíram do aposento e correram para a passagem no corredor, ficaram um pouco a espreita, e avistaram o Soldado com sua espada e mais dois guardas...

segunda-feira, 14 de julho de 2008

O livro dos dias

Havia naquele reino de estranhos um livro misterioso, escrito por um poeta, tido por nobres e plebeus com um vidente, a frente de seu tempo, pela curiosa coincidência entre o que escrevia e o que acontecia ao seu redor. Seus versos eram tidos como previsões, profecias. Sua escrita enigmática seria num futuro distante tida como reveladora. Estudiosos se debruçariam sobre ela como se a mesma tivesse um código secreto, que ao ser desvendado poderia conter segredos do próprio tempo futuro.

No entanto, o poeta tinha inspirações, fruto não de visões mas de emoções que sentia sobre o próprio reino e seus habitantes aprisionados pelo tempo. Escrevia em couro seco de cabra com pena de ganso e corante de plantas. Escrevia ora a noite, ora de dia, sobre o futuro do presente, sobre o presente do futuro e sobre o futuro do futuro. Tempos verbais e não siderais. Não tinha a pretensão de ser profeta, apenas um poeta. As palavras dançavam em sua mente, mas não era vidente...

O bispo temia sua escrita, ameaçava-o seguidamente com a fogueira. Mas o poeta dizia que seus versos eram para o rei, que vaidoso, o tinha como seu artista preferido, dando-lhe proteção e abrigo dentro das muralhas do castelo.

O poeta reunia diversos poemas, que batizara de O Livro dos Dias, fruto de suas vivências, observações e opiniões sobre o reino e seus habitantes... Ainda não tinham inventado a imprensa. A Bíblia ainda era copiada página por página por padres copistas. Toda vez que tinha uma inspiração, recolhia-se aos seus aposentos humildes, para ali não esquecer as palavras que o vento lhe soprava nos ouvidos...

Eu tive um sonho
em que subia numa pequena árvore,
a pequena árvore do sonhos
e de lá do alto, tudo era encantado,
como um quarto crescente,
onde o mundo pequeno tornava-se imenso...
As palavras caminhavam sobre a linha do horizonte...
as gotas da chuva tornavam-se puro cristal,
o mal não tinha morada e a amada,
vivia enclausurada em seu quadrante solar...
E a morte vivia longe, lá no fim do mundo,
Porém podia estar a qualquer momento
Bem mais próxima do que pensamos;
Ao lado da ponte, onde mora o coração valente...


Terminados os versos, o poeta adormeceu em seu catre. Na manhã seguinte, foi acordado às pressas pelo chefe da guarda, que o conduziu a presença do rei. O poeta carregou consigo os versos que tinha escrito no dia anterior, para dar de presente ao rei, inspirado na princesa Cristal, batizada com esse nome por conta do brilho de seus olhos.

O rei abatido, inconsolável, mortificado contou ao poeta sobre a morte de seu filho preferido, o príncipe herdeiro, próximo à ponte elevadiça, quando voltava de uma caçada onde fora a caça ao invés do caçador, haja vista ter seu peito traspassado por uma flecha mortal... O rei vendo as mãos trêmulas do poeta, segurando o couro de cabra avermelhado pela tintura dos versos e suor das próprias mãos, pediu com rigor para ver o que estava escrito nele. E ao ler aquele poema, começou para o poeta sua dupla sina... De profeta do rei e poeta encantado pela princesa Cristal, prometida a um nobre de posto, mas não de sentimento, doutro reino distante... Não podia contar que o quadrante solar que ele se referia nos versos era justamente a janela do quarto da princesa, que se iluminava cada vez que ele a via, ao subir na árvore próxima ao local. Um poeta, naquele reino, era condenado a fazer somente profecias ao invés de escrever poesias, sob pena de ser aprisionado como outros tantos na masmorra do castelo... O livro dos dias , para sua glória e sina, seria lido de agora em diante, e através dos tempos, de forma mística e sobrenatural...